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Postado por JOSÉ quinta-feira, 24 de dezembro de 2009 0 comentários

Revista Brasileira de Reumatologia
versão impressa ISSN 0482-5004
Rev. Bras. Reumatol. v.47 n.4 São Paulo jul./ago. 2007

doi: 10.1590/S0482-50042007000400006
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE



Artrite crônica e periodontite
RESUMO

Como parecem existir similaridades entre os mecanismos patogenéticos de doenças reumatológicas, como a artrite reumatóide e a artrite idiopática juvenil com a periodontite, alguns estudos têm sido publicados com o objetivo de levantar evidências de uma possível inter-relação entre essas condições. A artrite reumatóide parece modular a resposta imune do hospedeiro, podendo aumentar a suscetibilidade à doença periodontal destrutiva em adultos. Recentemente, evidenciou-se que também pacientes com artrite idiopática juvenil possuíam maior suscetibilidade à doença periodontal destrutiva comparados a indivíduos saudáveis da mesma idade. No entanto, ainda se desconhecem os mecanismos que justificariam uma hipótese de associação entre essas condições crônicas inflamatórias. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi promover uma revisão da literatura sobre uma possível relação entre artrite crônica e periodontiteINTRODUÇÃO

A artrite crônica e a periodontite apresentam similaridades em seus mecanismos patogênicos, o que tem despertado interesse na pesquisa sobre a associação entre essas condições(1). A artrite reumatóide (AR) pode funcionar como um modulador para a resposta imune no periodonto do hospedeiro, aumentando a suscetibilidade à doença periodontal destrutiva em adultos(2). Recentemente, nosso grupo de pesquisa observou que pacientes com artrite idiopática juvenil (AIJ) possuíam maior freqüência de perda de inserção clínica periodontal na região interproximal, comparados a indivíduos saudáveis da mesma idade(3). Sendo assim, este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão da literatura em relação a evidências sobre uma possível associação entre a AR, AIJ e a periodontite.



PERIODONTITE

O periodonto é definido como o conjunto de tecidos que circundam os dentes. Subdivide-se em periodonto de inserção (ligamento periodontal, cemento radicular e osso alveolar) e periodonto de proteção (gengiva) (Figura 1). A principal função do periodonto é inserir o dente no tecido ósseo dos maxilares e manter a integridade da superfície da mucosa mastigatória da cavidade oral. O grau de destruição que o periodonto apresenta num dado momento é medido por meio de uma sonda graduada em milímetros (sonda periodontal) (Figura 2). Com esse instrumento, podemos medir a profundidade do sulco gengival em seis faces por dente, bem como o nível de inserção. Além disso, sítios que apresentam inflamação no momento da sondagem sangram com o toque do instrumento, gerando um indicador de inflamação periodontal denominado sangramento à sondagem.















O sulco gengival é o espaço entre a gengiva e o dente que se estende da margem gengival até o fundo do sulco sondável. Em condições normais, o sulco apresenta uma profundidade à sondagem inferior ou igual a 3 milímetros (mm). Quando ocorre o aprofundamento do sulco gengival, isto é, quando a distância entre a margem gengival e o fundo da bolsa ultrapassa 3 mm, diz-se que houve formação da bolsa periodontal. A bolsa periodontal verdadeira acompanha-se da perda dos tecidos de inserção periodontal. O nível de inserção periodontal é definido clinicamente como a distância entre a junção cemento-esmalte (JCE) e o fundo da bolsa ou sulco. Uma vez que a gengiva está inserida no dente na altura da JCE, o nível de inserção clínica onde não ocorreu perda tecidual é zero. O sangramento à sondagem, o nível de placa bacteriana na superfície dental, a profundidade de bolsa à sondagem e as medidas do nível de inserção periodontal compõem os indicadores clínicos periodontais.

As principais condições inflamatórias que acometem o periodonto são gengivite e periodontite. A gengivite é uma inflamação apenas do periodonto de proteção e é clinicamente caracterizada por mudanças na coloração do tecido gengival (hiperemia) e presença de sangramento à sondagem e, normalmente, associa-se à presença de placa bacteriana no sulco gengival. Uma vez estabelecida a gengivite, se não houver interferência na formação continuada da placa bacteriana, pode desenvolver-se, em indivíduos suscetíveis, um quadro de periodontite.

A periodontite é uma inflamação crônica e destrutiva que leva à perda do tecido de suporte dos dentes e, eventualmente, àperda dentária e ao edentulismo. O ligamento periodontal e o tecido ósseo são destruídos por uma resposta imunológica à presença de bactérias no sulco gengival, especialmente as Gram-negativas, gerando inflamação. Essa destruição é, provavelmente, mediada por uma resposta alterada do hospedeiro, tornando-o suscetível ao desafio bacteriano. Ainda não está completamente esclarecido por que em alguns indivíduos a inflamação periodontal progride para periodontite e, em outros, restringe-se apenas à gengivite. No entanto, acredita-se que a progressão para periodontite possivelmente ocorra em virtude de uma combinação de eventos, incluindo o acúmulo de bactérias periodontopáticas, o aumento dos níveis de citocinas pró-inflamatórias, de enzimas proteolíticas e de prostaglandina E2(PGE2), somados a uma redução dos níveis de antagonistas de citocinas e inibidores de proteases(4). Na literatura, alguns fatores, como o fumo, têm sido considerados modificadores da resposta imunológica do hospedeiro e podem ser determinantes na variação à suscetibilidade à periodontite(5).

Assim, a periodontite pode ser considerada uma inflamação que vai além da gengiva, alcançando o tecido ósseo subjacente, o ligamento periodontal e o cemento radicular, levando à formação da bolsa periodontal. Clinicamente, além da presença da bolsa periodontal, podemos observar a perda da inserção periodontal e, radiologicamente, a de tecido ósseo.

Estudos têm evidenciado uma possível associação entre a periodontite e algumas condições reumatológicas, onde está presente a artrite crônica(2,3, 6,7).



HIPÓTESES DE ASSOCIAÇÃO ENTRE A ARTRITE CRÔNICA E A PERIODONTITE

Há estudos sugerindo que condições reumatológicas, como a AR e a AIJ, também possam ser modificadoras do processo saúde-doença periodontal, aumentando a suscetibilidade à doença periodontal destrutiva, tanto em adultos(2,6) como em crianças e adolescentes(3,7). No entanto, esses resultados não são corroborados por outros estudos(8). A Tabela 1 descreve os principais trabalhos inter-relacionando a AR e a AIJ com condições orais.








Algumas hipóteses têm sido sugeridas para justificar uma possível associação entre a AR e a periodontite. Tais hipóteses serviriam também, com plausibilidade biológica, para uma inter-relação entre a AIJ e a periodontite, uma vez que, em todas essas condições, evidencia-se uma importante desregulação do sistema imune, possivelmente associada a ou influenciada por fatores genéticos e ambientais. A inter-relação entre a artrite crônica e a periodontite parece ter um caráter bidirecional.

Uma das teorias que tenta explicar como a periodontite seria uma condição de risco à AR baseia-se na exposição crônica ao lipopolissacarídeo que ocorre nas doenças periodontais. Segundo esse conceito, o lipopolissacarídeo de bactérias periodontopáticas serviria como uma fonte de superantígenos ao hospedeiro, podendo iniciar a cascata imunológica observada na AR(9). Por outro lado, a desregulação imunológica observada na AR, gerando o aumento de citocinas como a interleucina 1 (IL-1), o fator de necrose tumoral (TNF-a) e a IL-6, local e sistemicamente, faria com que pacientes com artrite reumatóide, na presença de patógenos periodontais e um meio ambiente propício, desenvolvessem maior suscetibilidade à periodontite(6). Além disso, a hiperatividade neutrofílica tem sido evidenciada em certas doenças crônicas e parece justificar possíveis inter-relações entre algumas condições inflamatórias. Os neutrófilos são as células mais importantes nas articulações de pacientes com AR ativa e parecem desempenhar uma importante função na periodontite. Evidenciou-se hiperatividade de neutrófilos tanto na periodontite quanto na artrite. Desta forma, talvez uma doença possa funcionar como estímulo pré-ativador para neutrófilos periféricos, fazendo que essas células ajam de forma mais agressiva, quando recrutadas para atuar em outra doença(10-12).

O tratamento inicial clássico para pacientes com artrite crônica inclui a utilização de antiinflamatórios não esteróides (AINEs), que têm sido estudados como adjuntos no tratamento periodontal. Um estudo retrospectivo mostrou menor perda óssea alveolar em pacientes portadores de AR que faziam uso de AINEs, comparados a um grupo de indivíduos saudáveis que não usava medicação(13). Por outro lado, outros autores(14) observaram que pacientes que faziam uso crônico desse tipo de medicamento não apresentavam diferenças no índice de placa, índice gengival, profundidade de bolsa, perda de inserção periodontal e perda óssea comparados a indivíduos não medicados.



DISCUSSÃO

O conhecimento de que o sistema imune participa ativamente da patogênese da AR, AIJ e periodontite tem estimulado a realização de vários estudos para avaliar o status periodontal em pacientes com AR e AIJ. Na AR, AIJ e periodontite, a presença de atividade clínica mostra, em nível sistêmico e local, um nível aumentado de citocinas pró-inflamatórias, além de baixos níveis de inibidores de metaloproteinases, altos níveis de metaloproteinases de matriz e prostaglandina E2 secretados por macrófagos, fibroblastos e outras células inflamatórias(4'10-12,15). Alguns estudos demonstram piores condições periodontais em adultos e jovens, além de maior freqüência de perda dentária em pacientes com AR e AIJ, comparados a controles saudáveis(2,3,6,9,15,16). Entretanto, outros estudos apontam uma evidência de condições similares ou até mesmo tendência para melhores indicadores periodontais em pacientes com AR(8). Diferenças nos critérios de doença e nos métodos para avaliar o status da doença periodontal formam o principal problema na interpretação desta literatura. Além disso, muito embora o uso prolongado de AINEs possa não alterar os índices clínicos periodontais(14), há evidência de que essas drogas, utilizadas durante um longo período de tempo, afetam a progressão da perda óssea periodontal(13). Desta forma, a falha em demonstrar uma inter-relação entre a artrite crônica e a periodontite talvez possa ser atribuída ao uso crônico de AINEs pelos pacientes com AR e AIJ. Além disso, os estudos disponíveis sobre o status periodontal em portadores de alterações reumatológicas são transversais, tornando difícil avaliar pontos importantes como as causas de perda dentária. Recentemente, um estudo longitudinal que acompanhou pacientes com AIJ por 2 anos mostrou que, após controle clínico e laboratorial com tratamento adequado (que incluiu corticosteróide, metotrexato e AINEs), houve significativa diminuição nos níveis de IL-1b no fluido crevicular cervical, mas não houve diferença estatisticamente significativa, quando comparados ao grupo controle, em relação à inflamação periodontal clínica e laboratorial. Isto poderia indicar que, em relação ao binômio AIJ-periodontite, a doença controlada e inativa não mais influenciaria o status periodontal, ratificando a existência de uma inter-relação entre ambas as condições(7).

Assim, se a AIJ se associa ou não à progressão de outras condições inflamatórias como a periodontite, ainda não está completamente esclarecido. Entretanto, a artrite e a periodontite parecem apresentar semelhanças em seus mecanismos patogenéticos. Novos trabalhos prospectivos são necessários para avaliar a associação entre essas inflamações.

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Revista Brasileira de Reumatologia
versão impressa ISSN 0482-5004
Rev. Bras. Reumatol. v.47 n.4 São Paulo jul./ago. 2007

doi: 10.1590/S0482-50042007000400013
RELATO DE CASO CASE REPORT



Síndrome CINCA: um diagnóstico diferencial da artrite idiopática juvenil

RESUMO

A síndrome CINCA (crônico-infantil-neurológica-cutâneaarticular) é uma enfermidade inflamatória multissistêmica rara, de início no período neonatal e caracterizada por febre, exantema cutâneo, envolvimento articular e do sistema nervoso central. É também conhecida pela literatura médica norte-americana como NOMID (doença multissistêmica inflamatória de início neonatal). Relatamos o caso de uma criança de 3 anos de idade admitida em nosso serviço com história de febre e exantema cutâneo desde o período neonatal. Apresentou crises convulsivas no sexto mês de vida e artrite simétrica de joelhos desde o nono mês. Na admissão, mostrava-se toxemiada, pálida, com um exantema maculopapular generalizado e artrite de joelhos e tornozelos. Apresentava ainda retardo de crescimento e desenvolvimento. Achados laboratoriais incluíram anemia, leucocitose, trombocitose, níveis elevados de proteína C reativa e meningite asséptica no exame do liquor. Os outros exames foram negativos. Os achados radiográficos dos joelhos, quadris e tornozelos foram anormais. A criança recebeu tratamento com antiinflamatório não hormonal, corticosteróide e metotrexato, com melhora apenas da dor e da febre. A etiologia da síndrome CINCA permanece desconhecida e nenhum tratamento tem se mostrado eficaz. Essa doença deve ser distinguida da forma sistêmica da artrite idiopática juvenil (AIJ), o principal diagnóstico diferencial.


INTRODUÇÃO

A síndrome CINCA (crônico-infantil-neurológica-cutânea-articular) foi descrita na Europa, em 1981, por Prieur-Griscelli, como uma enfermidade inflamatória multissistêmica de início na infância(1-6). É também conhecida pelos norte-americanos como NOMID (neonatal onset multisystem inflammatory disease)(7-10). Inicia-se no período neonatal, caracterizada por febre, meningite crônica, uveíte, perda neurossensorial da audição e artropatia deformante(3,7). São poucos os casos relatados mundialmente e no Brasil até o momento(11). Essa doença é rara e confundida com a forma sistêmica da artrite idiopática juvenil (AIJ), sendo comum o atraso no diagnóstico(9). Apesar de não existirem ainda critérios bem definidos e esquema terapêutico padronizado, o diagnóstico precoce é importante para diminuir as seqüelas da doença.

Relatamos o caso de uma criança que apresentava exantema generalizado desde o primeiro mês de vida, febre diária desde os 8 meses e artropatia desde os 9 meses. O diagnóstico foi feito aos 3 anos de idade. O objetivo deste relato é sugerir o diagnóstico da síndrome CINCA quando as manifestações clínicas forem analisadas em um contexto clínico pertinente.



RELATO DE CASO

DNS, sexo feminino, branca, nascida de parto normal, a termo, com peso de 3.150 g e estatura de 48 cm. Desde 1 mês de vida, apresentava exantema em todo o corpo e febre diária a partir do 8º mês de vida. Aos 9 e 14 meses foram referidas duas crises convulsivas febris, tônico-clônicas generalizadas, controladas completamente com o uso de fenobarbital, via oral, 4 mg/kg/dia. Aos 9 meses, teve início artrite simétrica de joelhos, dolorosa à palpação e à movimentação, evoluindo para poliartrite em mãos, punhos, cotovelos e tornozelos.

O primeiro exame neurológico foi realizado no 12º mês de vida, quando se observou atraso do desenvolvimento neuropsicomotor, com incapacidade para deambular, hipotonia e postura de batráquio, sentando-se apenas com apoio. Aos 2 anos de idade foi encaminhada ao Ambulatório de Reumatologia Pediátrica do Hospital Universitário da UFMS com diagnóstico de síndrome genética a esclarecer e retardo pôndero-estatural (percentil de peso e altura menor que 2,5). O diagnóstico inicial na admissão foi de artrite idiopática juvenil. Ao exame físico, observaram-se irritabilidade e exantema generalizado e pruriginoso que se exarcebava durante a febre (dois a três picos diários) (Figura 1). Ao exame osteoarticular, apresentava aumento de volume em joelhos, tornozelos, cotovelos, punhos e articulações interfalangeanas das mãos, com limitação à flexão e à extensão (Figura 2). Os exames laboratoriais mostraram anemia, leucocitose, plaquetose, provas inflamatórias elevadas (PCR = 87,2 mg/l, VHS = 81 mm/h, mucoproteínas = 11,5 mg/dl, alfa 1 glicoproteína ácida = 273,6 mg/dl). A dosagem de fosfatase alcalina (726) e de IgE (744,1) estava elevada. A dosagem de outras imunoglobulinas (IgG, IgM, IgA, IgD), cálcio e fósforo sérico foi normal. O fator antinúcleo (FAN), fator reumatóide (FR), enzimas musculares, provas de funções renal e hepática, dosagem de complemento, líquido cerebroespinal e cariótipo foram normais. As sorologias para doença crônica intra-útero foram negativas, exceto por dosagem elevada de IgG para citomegalovírus. O eletroencefalograma, a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM) de crânio não evidenciaram alterações.















Nas radiografias dos ossos longos, observaram-se marcada desmineralização óssea, periostite diafisária, encurtamento dos membros inferiores e joelhos em flexão, metáfises, cartilagens de conjugação e epífises alargadas em copa, fragmentação principalmente epifisária nas articulações dos joelhos, tornozelos, calcâneos, punhos e cotovelos, além de hipertrofia e fragmentação da patela bilateralmente (Figura 3).








Realizou-se pesquisa genética para síndrome CINCA para verificar mutação no gene CIAS1 (éxon 3) pelo método de reação em cadeia da polimerase (PCR), tendo sido confirmada a mutação A439P no gene CIAS1. Estabeleceu-se o diagnóstico de síndrome CINCA aos 3 anos de idade e iniciou-se tratamento com corticóide via oral (prednisona 1 mg/kg/dia) e antiinflamatório não hormonal (naproxeno 15 mg/kg/dia) com melhora apenas da febre, persistindo os demais sintomas. Seis meses após, associou-se metotrexato na dose de 0,5 mg/kg/semana, e permanece até o momento com essas medicações. Apresenta melhora das crises de dor, febre e exantema, embora com as limitações da seqüela articular.

A paciente está em uso de órteses em punhos e joelhos e em acompanhamento multidisciplinar, realizando sessões de hidroterapia, fisioterapia motora, fonoaudiologia e terapia ocupacional. Quanto ao exame neurológico, mantém atraso na linguagem, com frases gramaticais e dislalia de troca e compreensão de ordens simples. Senta com apoio, não muda de decúbito, não engatinha nem apresenta controle de esfíncteres. Os reflexos estão presentes e normais, sem comprometimento de pares cranianos. O exame oftalmológico e a audiometria realizados com 3 anos e 6 meses de idade foram normais.



DISCUSSÃO

A síndrome CINCA é uma doença rara, crônica, que acomete crianças desde os primeiros meses de vida. Como essa doença não está associada a elevações de títulos de auto-anticorpos nem antígenos específicos, não é classificada como uma doença auto-imune clássica, mas auto-inflamatória(6-7). O sinal clínico mais precoce da doença, que pode estar presente ao nascimento em 80% dos casos, é o exantema, do tipo urticariforme, maculopapular, evanescente, de formas irregulares que se exarceba durante a febre e a exposição solar. A febre diária intermitente, dificilmente superior a 39ºC, é uma das primeiras manifestações da doença(3,12).

O envolvimento articular simétrico da síndrome CINCA pode variar de edema discreto à artropatia destrutiva(15). As articulações mais acometidas são os joelhos (em 100% dos pacientes), cotovelos e tornozelos, como ocorreu no caso em estudo(3,10,12). Pode afetar ainda articulações das mãos, punhos e pés, com contraturas fibrotendíneas; raramente o esqueleto axial, os ombros e os quadris estão envolvidos(2,13). Em 50% dos pacientes, a artrite inicia-se no primeiro ano de vida, sendo o prognóstico pior com rápida progressão e incapacidade funcional. Nos 50% restantes, as alterações articulares são moderadas e não destrutivas, iniciando-se após os 2 anos de idade. Entesopatia associada à tenossinovite em membros inferiores também foi descrita em um caso(6).

O acometimento do sistema nervoso central (SNC) é variável tanto na intensidade quanto na forma, sendo muito frequentes meningite crônica asséptica, cefaléia, macrocrania, calcificações intracranianas, espasticidade, convulsões, diminuição cognitiva, hipotonia e atraso do desenvolvimento neuropsicomotor (2,3,11,13).

Outras manifestações descritas são retardo de crescimento, nariz em sela, dedos grossos e curtos com baqueteamento digital, hepatosplenomegalia, linfonodomegalia, proteinúria, nefrite mesangial e disfunção hepática(2,8,11,13,14). Envolvimento de órgãos sensoriais, incluindo manifestações oculares e surdez progressiva neurossensorial, foi documentado em 22% dos pacientes(13). Em estudo multicêntrico internacional sobre as manifestações oculares da síndrome CINCA, alterações do disco óptico foram relatadas em 83% dos pacientes, caracterizadas por edema, pseudopapiledema e atrofia do nervo óptico; uveíte anterior crônica, em 55%. Perda da acuidade visual em pelo menos um olho e vasculite retiniana foram observadas por outros autores(2,13).

O diagnóstico da síndrome CINCA é essencialmente clínico. Recentemente muitos avanços têm sido alcançados, com base na medicina molecular e na genética(15). A recorrência familiar sugere o caráter esporádico da doença(1,6). Apesar das semelhanças clínicas com as infecções intra-uterinas ou neonatais, a pesquisa de vírus, fungos, bactérias e imunodeficiências tem sido negativa(4). Causas ambientais, defeitos de neutrófilos, desregulação da função das citocinas e alterações de cartilagem têm sido aventados como etiologia da síndrome(2,3,8,10). A ativação de alguns marcadores de neutrófilos como o CD10 pode ser a causa das alterações inflamatórias típicas de alguns pacientes com a síndrome CINCA(5). Estudos anteriores indicaram que os neutrófilos poderiam desempenhar papel central na patogênese da doença(3).

Aproximadamente 50 mutações independentes no gene CIAS1 (cuja expressão é alta em células polimorfonucleares e condrócitos)(1) foram encontradas, todas afetando o éxon 3(7,11,15). A criopirina, produto do gene CIAS1, também tem sido implicada na regulação da inflamação mediante a ativação do fator nuclear kappa beta, da regulação de interleucina 1 e de outras citocinas(1,5,7,9,15). Prieur et al.(3) já haviam demonstrado, in vitro, a inibição da proliferação de condrócitos pelo soro de alguns pacientes portadores da doença, sugerindo, como em outros estudos, que a cartilagem seria o órgão-alvo da inflamação na síndrome CINCA(10).

Nos exames complementares, observam-se anemia hipocrômica, leucocitose com predomínio de neutrófilos e eosinófilos, plaquetose e elevação de provas de fase aguda(2,4,8). A eletroforese de proteínas pode mostrar hipergamaglobulinemia policlonal (IgG, IgM ou IgA) (3-5). A dosagem de complemento sérico e de imunocomplexos circulantes não mostra alterações significativas(2,3,8,10). O líquido cerebroespinal geralmente é normal(12), mas pode haver aumento de celularidade(2) principalmente eosinorraquia, e/ou aumento de proteínas(2). O exame anatomopatológico em medula óssea, fígado, pele e linfonodos demonstra processo inflamatório crônico inespecífico e presença de eosinófilos(3). No exame histológico da membrana sinovial, observa-se também um processo inflamatório discreto com infiltrado perivascular constituído por neutrófilos, eosinófilos e mastócitos. Ocorrem, ainda, necrose focal e proliferação desorganizada de condrócitos(10).

As imagens características da doença que sugerem o diagnóstico são vistas nas extremidades distais dos ossos longos, comprometendo em freqüência decrescente os joelhos, tornozelos, punhos e cotovelos. O achado radiológico mais consistente nos segmentos envolvidos são as metáfises largas e em copa, cartilagens de conjugação fragmentadas e epífises aumentadas com calcificação irregular. É constante o aumento no volume das patelas, observando-se ossificação prematura e grosseira. Entre as complicações, pode ocorrer fratura óssea espontânea conseqüente à desmineralização óssea. Há relatos de degeneração óssea para condrossarcoma(4,10). As alterações radiográficas ocorrem em aproximadamente metade dos casos durante o primeiro ano de vida. A paciente relatada apresentou as alterações clássicas nos joelhos, tornozelos, punhos, cotovelos e fragmentação das epífises dos calcâneos. A RM das articulações mostra aumento no volume, sem comprometimento sinovial importante(4,8,10).

Fontanelas amplas, com retardo no fechamento e ossos wormianos, podem ser vistas na radiografia do crânio. A TC e RM de crânio freqüentemente são normais, porém podem mostrar alargamento ventricular com atrofia cerebral e aumento dos fluidos nos espaços extra-axiais, calcificações da foice e dura-máter(2,12).

O principal diagnóstico diferencial a ser feito é com a artrite idiopática juvenil (AIJ)(10,11) e a da forma sistêmica, pois ambas são de diagnóstico essencialmente clínico e apresentam aumento das provas inflamatórias, leucocitose, plaquetose e anemia. Neste subtipo ocorrem surtos febris e exantema cutâneo típico. As lesões são maculopapulares eritematosas e fugazes, afetando todo o corpo, mas mais localizadas em tronco e membros e exarcebam durante os picos febris. A artrite é, geralmente, poliarticular, simétrica e aditiva, acometendo tanto grandes como pequenas articulações. O exame radiológico pode ajudar a diferenciá-la. A principal diferença radiológica é que na síndrome CINCA as alterações ocorrem nas cartilagens de crescimento, epífises e patelas, enquanto as lesões da AIJ comprometem as superfícies articulares(3). Outra diferença é que o envolvimento do SNC e o retardo mental peculiares à síndrome CINCA não ocorrem na AIJ(4,10).

Os outros diagnósticos diferenciais devem ser feitos com doenças do período neonatal, como infecções crônicas intra-útero, hipergamaglobulinemia D (que pode cursar com artrite, febre e exantema), síndrome de Sweet (dermatose neutrofílica febril), FAPA (febre periódica, adenopatia, faringite e estomatite aftosa), histiocitose, mastocitose, rubéola neonatal de início tardio, síndrome de Muckle-Wels (exantema urticariforme, artrite e surdez), Wissler Fanconi e febre familiar do Mediterrâneo(3,11,12).

O tratamento é, freqüentemente, empírico, pois ainda não existe consenso. Antiinflamatórios não hormonais e corticoesteróides têm sido utilizados com resultados variáveis(3,4,14). Os corticoesteróides têm se mostrado eficazes no alívio da dor e dos picos febris, como ocorreu no caso descrito, mas sem modificação das provas inflamatórias, das alterações cutâneas e articulares. Alguns autores têm utilizado precocemente drogas imunossupressoras, como metotrexato, ciclofosfamida, clorambucil, D-penicilamina, ciclosporina(12), azatioprina(2,10) e sais de ouro, e imunomoduladores (gamaglobulina endovenosa), com o objetivo de bloquear a evolução da doença, diminuir a atividade inflamatória, permitir o crescimento e desenvolvimento adequado da criança e diminuir seqüelas(4). Entretanto, ainda não se tem evidências de que esses medicamentos modifiquem a evolução da doença(2-4,10). A regulação pela CIAS1 sugere que um bloqueador de receptor de inter-leucina 1 possa constituir um tratamento eficaz, entretanto mais estudos são necessários para melhor identificar essa via antiinflamatória(1,7,14). A terapia biológica está em estudo experimental; o etarnecept foi usado recentemente em uma criança de 4 anos de idade, por 6 meses, com melhora importante do quadro articular e diminuição da freqüência dos episódios febris, sugerindo o provável papel do TNF alfa (fator de necrose tumoral alfa) na fisiopatologia da doença(14). A fisioterapia com hidroterapia e a terapia ocupacional com uso de órteses constituem parte importante no tratamento dessa doença(2,4).

O prognóstico da síndrome CINCA é pior em pacientes que apresentam a doença no período neonatal. Alguns autores sugeriram que a severidade dos sintomas poderia ser influenciada pelos locais de mutação no gene CIAS1(9). O curso progressivo natural da doença é típico, levando à incapacidade motora e adaptativa(14). Incapacidade funcional significativa ocorre em mais de 50% dos pacientes. Em 100% das crianças, ocorre retardo de desenvolvimento pôndero-estatural. O óbito ocorre na adolescência ou no adulto jovem em 20% dos pacientes por infecção, complicações neurológicas ou por amiloidose secundária(3,6,12).

Em virtude de a etiologia e a fisiopatologia da síndrome CINCA permanecerem incertas e sendo poucos os casos relatados na literatura mundial, há dificuldade na padronização dos critérios diagnósticos e tratamento. Este relato de caso tem como objetivo alertar o reumatologista para este diagnóstico diferencial da AIJ sistêmica que, apesar de raro, pode acarretar incapacidade funcional severa. O diagnóstico e a instituição terapêutica mais precoce podem minimizar as seqüelas. Os constantes avanços da medicina genética poderão melhorar a prevenção e o tratamento da síndrome CINCA.

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Revista Brasileira de Reumatologia
versão impressa ISSN 0482-5004
Rev. Bras. Reumatol. v.47 n.5 São Paulo set./out. 2007

doi: 10.1590/S0482-50042007000500016
RELATO DE CASO CASE REPORT



Poliartrite e nódulos subcutâneos como primeira manifestação de carcinoma de pâncreas

RESUMO

A associação de poliartrite, nódulos subcutâneos e carcinoma de pâncreas é uma condição rara e pouco diagnosticada. O presente trabalho tem o objetivo de relatar um caso de carcinoma pancreático associado a poliartrite e nódulos subcutâneos, semelhantes ao eritema nodoso, cujo exame histopatológico evidenciou tratar-se de paniculite com necrose gordurosa. Os autores pretendem, por meio deste relato, lembrar essa associação incomum que se torna de grande importância clínica, considerando que artrite e nódulos subcutâneos podem anteceder as manifestações clínicas de neoplasia pancreáticaINTRODUÇÃO

A associação de necrose gordurosa e doença pancreática foi primeiramente descrita por Hansemann, em 1882, e Chiari, em 1883. Em 1908, Berner relatou síndrome similar, porém associada com malignidade pancreática(1-5). Em 1914, Jenckel relatou o componente articular como parte dessa síndrome. Artrite, paniculite e doença pancreática têm sido encontradas formando uma rara tríade, ocorrendo em menos de 1% dos pacientes com pancreatite aguda ou carcinoma pancreático(1,6).

Poliartrite pode ocorrer como manifestação de vários processos patológicos, podendo ser encontrada em associação à doença pancreática(1), porém raramente o quadro de artrite antecede o diagnóstico de uma doença pancreática silenciosa(2,3).

Necrose gordurosa subcutânea tem sua origem ainda pouco esclarecida. Sugere-se que possa estar relacionada a um processo de degradação do tecido adiposo pela liberação de enzimas pancreáticas. Sua forma mais comum de apresentação clínica é como nódulos eritematosos, ocorrendo em 2% a 3% de todos os pacientes com doença pancreática(7).

Os autores relatam um caso de neoplasia pancreática, em que artrite e lesões eritematosas nodulares precederam o diagnóstico de doença pancreática.



RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, branco, 63 anos, aposentado, natural de Recife, residente em Muriaé (MG), diabético, tabagista e com história de etilismo, foi internado com quadro de artrite em articulações de punhos, joelhos, primeira metatarsofalangiana e tarso bilateralmente. Sentia dor de grande intensidade, eritema e calor havia aproximadamente 3 semanas. Relatava febre em torno de 38°C, com freqüência diária, e lesões nodulares, eritematosas e dolorosas (2 a 3 cm de diâmetro) localizadas principalmente em membros inferiores, mas que também acometiam membros superiores, semelhantes ao eritema nodoso.

Não havia queixa em relação aos sistemas respiratório, digestivo nem urinário. Os exames complementares revelavam discreta anemia (hemoglobina= 11,1 g/dl) e leucocitose (leucometria global = 25.200 céls./mm3), sem desvio à esquerda, e elevação significativa da velocidade de sedimentação das hemácias (108 mm na primeira hora) e proteína C reativa 164 mg/l (normal até 6 mg/l).

Aventou-se a hipótese de artrite infecciosa ou quadro articular reacional. Artrocentese não obteve líquido sinovial para culturas e demais exames de rotina. Iniciou-se tratamento com ceftriaxona, oxacilina e analgésicos. Após 10 dias de tratamento parenteral, não havia nenhum sinal de melhora, continuando com poliartrite dolorosa e os nódulos subcutâneos eritematosos dolorosos. Optou-se por iniciar terapia com glicocorticóide (prednisona 40 mg/dia), que também não alterou a evolução do quadro.

Biópsia de nódulo de membro inferior revelou paniculite mista do tipo necrose gordurosa.

Baseando-se nesse resultado, sugeriu-se pesquisa de doença pancreática como causa de nódulo subcutâneo e presença de necrose gordurosa. Não havia sintomas abdominais e a ultra-sonografia abdominal total mostrou-se normal. A dosagem das enzimas pancreáticas mostrou os seguintes resultados: amilase de 2.847U/l (valor normal: 25 a 125 U/l) e lipase de 280 U/l (valor normal: 2 a 18 U/l). Prosseguindo a investigação, realizou-se tomografia computadorizada de abdome, que evidenciou calcificações e a presença de lesão de aspecto tumoral, de 3 cm, em topografia de cabeça de pâncreas. O quadro articular ainda não havia mostrado nenhuma melhora, e solicitou-se acompanhamento da gastroenterologia.

Posteriormente, realizou-se tentativa de biópsia de pâncreas via endoscópica, sem sucesso. O paciente evoluiu rapidamente, com queda significativa do estado geral, não havendo possibilidade de cirurgia, nem de quimioterapia, vindo a falecer em 2 meses.



DISCUSSÃO

Doenças pancreáticas (inflamatórias ou neoplásicas) têm sido associadas a uma entidade bem estabelecida, que inclui: necrose gordurosa subcutânea (paniculite) e artropatia(8). O reconhecimento dessa entidade é relevante para o diagnóstico e terapêutica precoces, sobretudo em casos de doença pancreática oculta (como ocorreu nesse caso)(9), visto que lesões de pele e manifestações articulares podem preceder sintomas abdominais da doença pancreática. Pancreatite, freqüentemente com pseudocistos, e carcinoma de células acinares são as principais doenças pancreáticas associadas, mas o espectro é ainda maior, incluindo cálculo e trauma pancreático, pancreatite isquêmica, fístula arteriovenosa do ducto pancreático, entre outras(8,10,11).

O mecanismo envolvido na patogênese da necrose gordurosa subcutânea e periarticular ainda é pouco conhecido. Sugere-se que esteja relacionado à lipase pancreática oriunda da hipersecreção de células acinares tumorais, ou resultante de obstrução ductal em razão de pancreatite edematosa concomitante(8). Uma vez na circulação sistêmica, ocorre autodigestão de gordura subcutânea periarticular(1,5) e de outros sítios, onde, posteriormente, a lipase vem a ser ativada(3,12,13), desencadeando reação inflamatória.

A paniculite é uma lesão altamente específica para doença pancreática, particularmente carcinoma acinar de pâncreas, e denota pior prognóstico(9). Clinicamente, manifesta-se principalmente como nódulos dolorosos, medindo cerca de 1 a 2 cm, eritematosos, podendo surgir isolados ou difusos(12). Podem ocorrer em qualquer local do corpo, mas freqüentemente acometem membros inferiores(3,4,9), sobretudo em área pré-tibial(6,11) e parte inferior dos joelhos(14) . No caso relatado, observou-se essa preferência de localização dos nódulos. Observa-se, em outros relatos de casos, que a paniculite geralmente precede o diagnóstico de 1 a 7 meses, podendo ser um anúncio de doença metastática(9), regredindo em 2 a 8 semanas, transformando-se em escaras pigmentadas. Na sua forma grave, podem-se tornar flutuantes ou ulcerativas(9,11). O diagnóstico diferencial de tais nódulos inclui: doença de Weber-Christian, eritema nodoso, paniculite lúpica, vasculites e reação a drogas(4,6,7). A histologia é diagnóstica, mostrando uma forma única de necrose gordurosa (paniculite primária)(8). Os achados patológicos em lesões agudas incluem a presença de células anucleadas, com áreas de necrose gordurosa cercadas por células inflamatórias(1,9,13). Tais características não estão presentes em outras causas de paniculite(6,12) .

Ainda em relação às manifestações clínicas, podem-se encontrar febre, eosinofilia, dor abdominal, náuseas e vômitos. O paciente em questão não apresentou sinais nem sintomas abdominais, o que, de certa forma, dificultou e retardou o diagnóstico da doença pancreática. Outros casos na literatura atentam para escassez de sintomas abdominais. História de etilismo crônico também foi fator comum à maioria dos relatos.

Embora não se tenha pesquisado no paciente relatado, o acometimento ósseo pode ocorrer, relacionando-se patologicamente à extensão da necrose gordurosa intramedular e à destruição trabecular óssea, cujo aspecto radiológico é citado como múltiplas lesões pequenas em região cortical de ossos longos, ocorrendo, geralmente, de modo indolor(1,6,10,14,15) .

A elevação sérica de enzimas pancreáticas verificada no relato e reportada em muitos casos reforça a patogênese da necrose gordurosa(1,8,11,12) . Estudos comparativos sugerem que tais enzimas causariam hidrólise no tecido adiposo periarticular e na medula óssea, liberando ácidos gordurosos, que, por sua vez, atuariam desencadeando o processo inflamatório, sobretudo nas manifestações extrapancreáticas(8,10,11,12,16).

A poliartrite é uma rara complicação de pancreatite(4) e carcinoma pancreático(17). O envolvimento articular é variável, podendo ser mono ou poliarticular, manifestando-se concomitante ou separadamente dos nódulos subcutâneos, podendo preceder a dor abdominal ou qualquer outra evidência de doença pancreática(1). O acometimento articular pode mimetizar a gota, febre reumática, sarcoidose, artrite infecciosa ou doenças do tecido conjuntivo(1,3). A pesquisa diagnóstica deve, sempre que possível, incluir exame do líquido sinovial das articulações comprometidas, como também biópsia do nódulo. Sugere-se também a determinação de enzimas pancreáticas, ultra-sonografia de abdome total, principalmente em pacientes alcoólatras, com conhecida doença pancreática(1,18).

A terapia que emprega antiinflamatórios não esteroidais, glicocorticóides e agentes imunossupressores se mostrou ineficaz para reverter o processo inflamatório, não interferindo na evolução dos nódulos subcutâneos, nem no processo articular(1,8,14). No paciente relatado, realizou-se terapia com antiinflamatórios e glicocorticóides, após tratamento inicial com antibióticos, também sem melhora do processo inflamatório ou da dor.

Portanto, deve-se estar atento para a possibilidade diagnóstica de doença maligna pancreática, em vigência de paniculite e artrite, mesmo sem queixas abdominais.

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Revista Brasileira de Reumatologia
versão impressa ISSN 0482-5004
Rev. Bras. Reumatol. v.47 n.6 São Paulo nov./dez. 2007

doi: 10.1590/S0482-50042007000600004
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE



Marcadores de ativação endotelial e auto-anticorpos na artrite reumatóide


RESUMO

A artrite reumatóide (AR) é uma doença crônica inflamatória, caracterizada pela produção de auto-anticorpos e participação do endotélio vascular em sua patogênese.
OBJETIVOS: Analisar a correlação da molécula de adesão intercelular (ICAM-1), o fator de von Willebrand (vWF), o fator reumatóide (FR) e o anticorpo antipeptídeo citrulinado cíclico (anti-CCP) com parâmetros de atividade clínica, laboratorial e alterações radiológicas da AR.
MÉTODOS: Em 38 pacientes e 24 indivíduos que não apresentavam artrite reumatóide foram dosados FR, anti-CCP, vWF e ICAM-1 no soro. A atividade da doença foi definida pelo escore do DAS-28. O Health Assessment Questionnaire (HAQ) definiu a capacidade funcional, e os critérios revisados do American College of Rheumatology, a classe funcional. Radiografias de mãos e punhos quantificaram o índice de Sharp modificado.
RESULTADOS: A idade dos pacientes foi de 52 ± 12,5 anos e dos indivíduos que não apresentavam artrite reumatóide, de 49 ± 9,4 anos. O tempo de doença foi de 68 ± 66,6 meses. O vWF apresentou correlação significativa com o tempo de evolução da doença. Os auto-anticorpos tiveram correlação significativa com o índice de Sharp. A correlação do vWF e a ICAM-1 foi significativa com o DAS-28, mas apenas o vWF se correlacionou com o HAQ e com índice de Sharp.
CONCLUSÃO: Esse estudo demonstrou que os auto-anticorpos não estão correlacionados com a atividade da doença, mas com seu prognóstico e sua gravidade por meio da relação destes com o índice de Sharp. O vWF apresentou correlação significativa com os parâmetros de atividade e gravidade da doença.


INTRODUÇÃO

A artrite reumatóide (AR) é uma doença crônica inflamatória e a mais comum das doenças reumáticas auto-imunes(1). Sua prevalência é de, aproximadamente, 1% da população geral(2), com acometimento de ambos os sexos e predominância no sexo feminino, na proporção de 3-4:1. Ocorre mais na faixa etária dos 30 aos 50 anos(2,3). A evolução da doença caracteriza-se por danos teciduais articulares, podendo causar deformidades nas articulações e incapacidade funcional do indivíduo, com significativo impacto socioeconômico(4).

A patogênese da AR caracteriza-se pela produção de auto-anticorpos. O fator reumatóide (FR) está presente em 70% a 90% dos pacientes reumatóides(5). No entanto, o FR está positivo em 33% dos pacientes na fase inicial da doença, e sua especificidade é de 59% a 65%(6,7), podendo ser encontrado em outras condições clínicas. Na AR, o FR, apesar de não ser um marcador para diagnóstico, tem grande importância em relação ao prognóstico. Pacientes com títulos altos e persistentes de FR têm maior gravidade e, portanto, pior prognóstico(5).

O anticorpo antipeptídeo citrulinado cíclico (anti-CCP) tem sido muito estudado quanto à sua importância como marcador para diagnóstico e com grande valor preditivo para o prognóstico na AR. Estudos correlacionam o anti-CCP com a progressão erosiva óssea da doença sugerindo que pacientes com altos títulos de anti-CCP possam ter doença mais agressiva e, portanto, pior prognóstico(8). O anti-CCP pode ser detectado em 25% dos indivíduos em 1,5 a 9 anos do aparecimento dos primeiros sintomas, e no ano que antecede os sintomas sua sensibilidade aumenta para 52%, indicando a eficiência desses testes em predizer o desenvolvimento futuro da AR(9).

O endotélio vascular também exerce papel importante na patogênese da AR. Em condições normais, desempenha funções vitais como manutenção da permeabilidade seletiva e da homeostase, regulação do tônus vascular e as reações imunes, controle da síntese de células vasculares de crescimento, síntese de componentes da matriz extracelular e síntese, secreção e metabolismo de outros componentes biologicamente ativos(10). A capacidade de detectar a mínima alteração na pressão arterial, no fluxo sangüíneo, no balanço oxidativo, na coagulação, na inflamação e na ativação do sistema imune permite considerar a célula endotelial como o mais perfeito sensor biológico existente(11). O endotélio reage às agressões teciduais, sejam de natureza metabólica, física, química ou inflamatória. A reação induz ao aumento da expressão de moléculas de adesão celular e da permeabilidade vascular, facilitando a mobilização transendotelial de células mononucleares e polimorfomonucleares, assim como a ativação de citocinas e outras células pró-inflamatórias(12).

O vWF é uma glicoproteína secretada no plasma pelas células endoteliais e pelos megacariócitos. Sua função está na adesão e na agregação plaquetária, desempenhando um papel importante na formação de tampão hemostático. Especificamente na artrite reumatóide, o vWF, assim como a ICAM-1, está presente em resposta à inflamação ativa e persistente. A AR não está limitada apenas a uma inflamação articular, mas está presente na parede dos vasos. A disfunção endotelial com a inflamação persistente parece ter um papel importante na iniciação e na propagação da arteriosclerose envolvendo moléculas de adesão, citocinas, enzimas proteolíticas, com conseqüente destruição e também com desestabilização de placas arterioscleróticas, estimulando fatores de coagulação como o vWF(13,14).

A ICAM-1, proteína produzida pela célula endotelial, medeia a interação de células com a matriz extracelular e desempenha um papel importante no recrutamento e na retenção de células pró-inflamatórias. Sua produção é induzida por citocinas na disfunção do endotélio. A ICAM-1 está envolvida no processo inicial da inflamação e se mantém presente na progressão da sinovite reumatóide(15).

O objetivo do presente estudo foi analisar o perfil da expressão sorológica dos marcadores de disfunção endotelial, ICAM-1 e vWF e os auto-anticorpos, o FR e o anti-CCP, fazendo a correlação dessas variáveis entre si e com parâmetros de atividade clínica, laboratorial e alterações radiológicas pelo método de Sharp modificado em 38 pacientes reumatóides e num grupo-controle de 24 indivíduos.



PACIENTES E MÉTODOS

CASUÍSTICA

Participaram do estudo 38 pacientes com idade igual ou superior a 18 anos que preenchiam os critérios de classificação para AR, estabelecidos pelo Colégio Americano de Reumatologia (1987)(16). Foram escolhidos todos os pacientes que freqüentavam o Ambulatório de Reumatologia do Hospital Escola Dr. José Carneiro pertencente à Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL) em Maceió e que não apresentavam outras doenças crônicas. Para o grupo-controle foram selecionados indivíduos saudáveis, pareados em sexo e idade.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNCISAL (Nº 277). Após a ciência do termo de consentimento livre e esclarecido e a assinatura deste, foi preenchido protocolo clínico específico com anamnese e exame físico geral e articular, assim como o questionário de avaliação da qualidade funcional ou questionário de avaliação de saúde (Health Assessment Questionnaire – HAQ)(17) validado em português(18).

A avaliação radiográfica de punhos e mãos foi feita por meio de radiografias simples realizadas em posição póstero-anterior. Foram aceitos os exames realizados com diferença de tempo, de até três meses, antes ou depois da coleta do sangue. Os dados obtidos da avaliação das radiografias de cada paciente foram analisados pelo método de Sharp (modificado)(19).

Foram realizados os seguintes exames laboratoriais nos indivíduos que participaram da pesquisa: velocidade de hemossedimentação (VHS), proteína C reativa (PCR), FR, anti-CCP, ICAM-1 e vWF.

A VHS foi realizada pelo método de Westergren com valores de referência, na primeira hora, de 0 a 15 mm para homens e de 0 a 20 mm para mulheres. A PCR foi realizada por turbidimetria com valor de referência < 6,0 mg/L. O FR foi realizado por nefelometria, considerados negativos valores abaixo de 40 UI/mL. O anti-CCP foi medido por ELISA, tendo valor de referência < 20 UI/mL. Os valores de medida do anti-CCP de 20 a 39 UI/mL foram considerados positivos fracos de 40 a 59 UI/mL positivos moderados e e" 60 UI/mL positivos fortes. A ICAM-1 foi medida por ELISA e considerado negativo o valor < 306 ng/mL. Para medida do vWF, foi usada a técnica de imunoturbidimetria com valor de referência 50% a 160%.

Para a análise estatística, foi feita a análise descritiva de todas as variáveis do estudo. As variáveis qualitativas foram apresentadas em termos de seus valores absolutos e relativos(20,21). As variáveis quantitativas foram apresentadas em termos de seus valores de tendência central e de dispersão(20,21). Para se verificar a associação entre duas variáveis qualitativas, foi utilizado o teste de qui-quadrado(22). Para compararem-se os dois grupos, foi utilizado o teste T(20,23) (paramétrico), para as variáveis que apresentaram distribuição normal (teste de Kolmogorov-Smirnov(22)) e homogeneidade das variâncias (teste de Levene(20)), caso contrário, foi utilizado o teste U de Mann-Whitney(22) (não-paramétrico).

Para análise de correlação entre variáveis quantitativas (sem distribuição normal), foi utilizado o coeficiente de correlação de Spearman. O nível de rejeição da hipótese de nulidade ou nível de significância estatística foi considerado em 0,05% ou 5%.

Os testes estatísticos foram feitos usando o software SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 15.0.



RESULTADOS

As medidas descritivas dos dados demográficos dos pacientes e controles estão apresentadas na tabela 1.








No grupo de pacientes com AR, 31 pacientes (81,6%) apresentavam dor articular e 35 pacientes (92%) tinham rigidez matinal: 11 pacientes até 30 minutos, 14 até uma hora e dez acima de uma hora. No exame físico, 20 pacientes (52,6%) apresentavam articulações com aumento da temperatura cutânea, 21 (55,3%), articulações edemaciadas, 22 (57,9%), atrofia per articular e 13 pacientes (34,2%), seqüela de deformidade causada pela AR. Um paciente (2,6%) apresentava um nódulo reumatóide e nenhum paciente apresentou comprometimento de outros órgãos.

Os resultados dos exames laboratoriais realizados nos dois grupos estão apresentados na tabela 2.








As características dos parâmetros de atividade e gravidade da amostra de 38 pacientes com AR estão apresentadas na tabela 3.








O FR e o anti-CCP não apresentaram significância estatística com sexo, idade e tempo de evolução da doença (p > 0,05). Também não houve significância estatística dos auto-anticorpos com o HAQ e com a classe funcional da doença, assim como com o DAS-28, a VHS e a PCR (p > 0,05). Em relação ao índice de Sharp, o FR e o anti-CCP, estes apresentaram correlação estatística significante com o índice total de pinçamento mais erosão > 22. O perfil da correlação dos auto-anticorpos com os parâmetros clínicos e laboratoriais de atividade e gravidade está apresentado na tabela 4.

O anti-CCP apresentou correlação significativa com o FR (r = 0,637; p = < 0,001). Em relação aos marcadores de disfunção endotelial, vWF e ICAM-1, o FR apresentou significância estatística com os dois marcadores, e o anti-CCP somente com o vWF conforme demonstrado na tabela 5.

O vWF e a ICAM-1 não se associaram com o sexo e com a idade (p > 0,05). A análise estatística demonstrou que o vWF positivo se correlacionou com o tempo de evolução da doença (p = 0,03), com o HAQ (p = 0,02), com o DAS-28 (p = 0,02), com a PCR (p = 0,003) e com o Sharp (p = 0,001). Os dois marcadores não tiveram associação com a classe funcional. Não houve uma diferença significativa do resultado positivo da ICAM-1 entre as classes funcionais (p > 0,05). Esta apresentou significância estatística com DAS-28 (p = 0,04) e PCR (0,03). Os dois marcadores estavam positivos em 100% dos pacientes com escore do DAS e" 5,2.

O perfil de correlação do vWF e da ICAM-1 com os parâmetros de atividade e gravidade está na tabela 6.

Houve uma correlação estatisticamente significante entre vWF e ICAM-1 (r = 0,364; p = 0,025).



DISCUSSÃO

A AR é uma doença inflamatória na qual o endotélio exerce um papel importante em sua patogênese. Enquanto o endotélio saudável evita a adesão de células mononucleares, o mecanismo de defesa sob a influência da inflamação induz a expressão das moléculas de adesão que promove a aderência dos monócitos(24). Os estudos demonstram que a inflamação e a ativação endotelial persistente estimulam a produção de fatores homeostáticos endoteliais como o vWF(13). A ativação endotelial também exerce papel importante na ativação de células T CD4 e células B e estimula a produção de auto-anticorpos e a formação de imunocomplexos.

No presente estudo foram analisados o perfil de expressão sérica dos marcadores de disfunção e ativação endotelial ICAM-1 e vWF e os auto-anticorpos FR e anti-CCP utilizando uma amostra não-probabilística por conveniência na qual todos os pacientes com artrite reumatóide do Ambulatório de Reumatologia do Hospital Escola da UNCISAL no período de outubro de 2005 a dezembro de 2006 entraram para o estudo e em um grupo-controle pareado no sexo e idade com o objetivo de se estabelecer uma correlação com a atividade clínica, laboratorial e alterações radiológicas da doença e avaliar se a presença desses marcadores e os auto-anticorpos estariam relacionados com maior gravidade da doença.

Apesar de a evolução da doença do grupo-reumatóide ser superior a cinco anos (68 meses ± 66,6), o exame físico desses pacientes demonstra sinais de atividade clínica associados a sinais de cronicidade da doença como a presença de deformidades das articulações. Esses achados foram confirmados pelo aumento das provas de fase aguda de inflamação, pelos resultados do DAS-28, pela predominância dos pacientes nas classes funcionais II e III e com o HAQ de 1,33 ± 0,68. Esses dados juntamente ao índice total de Sharp para pinçamento mais erosões 31 ± 20,8 evidenciam a gravidade da doença nesses pacientes.

Os dois auto-anticorpos estudados apresentaram uma correlação semelhante em relação aos parâmetros de atividade e gravidade da doença. Pesquisas demonstram que a probabilidade diagnóstica aumenta, sensivelmente, em pacientes com FR IgM positivo associado ao anti-CCP positivo(25). O FR IgM e o anti-CCP também se correlacionam e, quando um aumenta, o outro também aumenta na maioria dos pacientes com AR, confirmando a heterogeneidade da etiopatogenia dessa doença(26,27). Em nossa casuís-tica, os auto-anticorpos não se associaram com atividade da doença, tempo de doença e classe funcional ou HAQ, estando de acordo com a literatura(28,29). Encontramos também uma correlação significativa dos auto-anticorpos com o Sharp, demonstrando que estes são importantes na evolução da doença para a injúria do tecido ósseo e, portanto, predizendo um pior prognóstico.

No presente estudo, a correlação do vWF com os parâmetros de atividade da doença, por meio de correlação significativa com o DAS-28, provas inflamatórias e HAQ, está implicada na inflamação ativa e persistente, demonstrando que, juntamente à ICAM 1, o vWF pode ser um instrumento a mais para avaliar o perfil de atividade da AR, diferentemente do estudo de Araújo et al.(30). A correlação estatisticamente significante com o índice Sharp sugere o valor do vWF como fator preditivo para o prognóstico da AR.

Neste estudo, a ICAM-1 apresentou uma correlação significativa com os principais parâmetros de atividade: VHS, PCR e DAS-28, confirmando os estudos da literatura(31-34), o que atesta a função da ICAM-1 como uma molécula envolvida no recrutamento, na retenção e na migração de células pró-inflamatórias pelo endotélio, portanto, seu aumento reflete doença ativa. No entanto, não houve correlação significativa da ICAM-1 com o índice de Sharp, reforçando mais uma vez a relação dessa molécula apenas com a atividade da doença. A ICAM-1 também não se correlacionou com o tempo de doença, visto que a ICAM-1 está relacionada à presença ou à ausência de atividade inflamatória, independentemente do tempo de evolução da doença. A significância estatística encontrada na correlação entre a ICAM-1 e o FR neste estudo, embora isso não esteja descrito na literatura, reflete a diversidade de processos envolvidos na patogênese da AR e comprova a importância da ativação endotelial na produção de auto-anticorpos e formação de imunocomplexos.

No presente estudo, observa-se que não houve correlação do FR e do o anti-CCP com parâmetros ligados à atividade clínica e laboratorial nos doentes com AR.

Foi significativa a correlação do FR e do anti-CCP com o índice de Sharp; houve correlação significativa do vWF e da ICAM com PCR e DAS-28; e houve correlação significativa do vWF com o HAQ e o índice Sharp.

Este trabalho reafirma a importância do endotélio na patogênese da artrite reumatóide, tanto na atividade inflamatória e perpetuação desta quanto na gravidade da doença como já demonstrado na literatura. Longe de elucidar o papel da ativação endotelial na AR, o que poderia favorecer o melhor entendimento de vários processos patogênicos específicos e intercorrentes, como lesão vascular e dislipidemias, este estudo abre várias perspectivas investigativas, porém, outros adicionais serão necessários. Do ponto de vista prático para o reumatologista, ainda não podemos aconselhá-lo no sentido de avaliar em seus pacientes marcadores de ativação endotelial. No que diz respeito aos auto-anticorpos, a pesquisa de anticorpos antipeptídeos citrulinados abre, sem dúvida alguma, um caminho importante, não somente para o diagnóstico mais precoce da AR, mas também para a melhor compreensão da etiopatogenia dessa intrigada doença. Neste sentido, como perspectivas futuras, o estudo de outros marcadores como antivimetina citrulinada e modificada (VCM), antígeno que representa melhor o "lócus sinovial", estudos genéticos, no que diz respeito à enzima PAD (peptidio arginina deiminase), bem como os haplotipos HLA DRB1, dentre outros, seriam de grande relevância investigativa e, possivelmente, prática.

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Revista Brasileira de Reumatologia

versão impressa ISSN 0482-5004

Rev. Bras. Reumatol. v.47 n.6 São Paulo nov./dez. 2007

doi: 10.1590/S0482-50042007000600005

ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Associação de imunodeficiências primárias com doenças auto-imunes na infância

RESUMO

INTRODUÇÃO: Sintomas musculoesqueléticos podem representar a primeira manifestação de imunodeficiências humorais primárias. A freqüência de deficiência seletiva de IgA em pacientes com artrite idiopática juvenil (AIJ símile) e lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) é de 2% a 4% e de 1% a 4%, respectivamente.
OBJETIVO:
Descrever pacientes que apresentaram artrite como primeiro sinal de uma imunodeficiência humoral primária e determinar a prevalência de deficiência seletiva de IgA em pacientes com diagnóstico de AIJ e LESJ.
PACIENTES E MÉTODOS:
Entre janeiro de 1983 e dezembro de 2006, 4.876 pacientes foram acompanhados na Unidade de Reumatologia Pediátrica. Uma avaliação retrospectiva foi realizada em pacientes que apresentaram artrite como primeira manifestação de imunodeficiência. As imunodeficiências humorais foram classificadas em: deficiência seletiva de IgA, hipogamaglobulinemia e deficiência de subclasses de IgG.
RESULTADOS: Onze (0,2%) pacientes apresentaram imunodeficiências humorais: deficiência seletiva de IgA ocorreu em oito, imunodeficiência comum variável em dois e deficiência de subclasses de IgG em um. Cinco dos 11 pacientes apresentaram artrite aguda e seis apresentaram artrite crônica não-erosiva (AIJ símile). Dosagem de imunoglobulinas foi realizada em 70 dos 253 pacientes com AIJ e deficiência seletiva de IgA (IgA sérica < 7 mg/dL) foi detectada em 6 (8,5%) – AIJ símile. Dos 45 pacientes com LESJ, com dosagem de IgA realizada, 3 (6,6%) apresentaram deficiência seletiva de IgA.
CONCLUSÃO: O presente estudo descreveu baixa prevalência de imunodeficiências humorais primárias em pacientes com doenças reumatológicas. Entretanto, a associação entre doenças auto-imunes e imunodeficiências sugere semelhanças em sua etiopatogenia e deve incentivar estudos prospectivos para investigação desta hipótese.

Palavras-chave: artrite, artrite idiopática juvenil, lúpus eritematoso sistêmico juvenil, imunodeficiência.

INTRODUÇÃO

As doenças reumatológicas da faixa etária pediátrica podem estar relacionadas com uma grande variedade de causas e diversas manifestações musculoesqueléticas e podem representar a primeira manifestação clínica de uma imunodeficiência primária(1).

A presença de artrite nas imunodeficiências humorais primárias é raramente descrita na literatura e pode ser a primeira e única manifestação clínica até que o diagnóstico seja estabelecido(2). A freqüência de deficiência seletiva de IgA (Def IgA) em pacientes com artrite crônica [artrite idiopática juvenil (AIJ) símile] é descrita entre 2% e 4%(3-5) dos casos, e o percentual da prevalência dessa imunodeficiência em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) é de 1% a 4%(3,6,7). A associação de doenças reumatológicas com hipogamaglobulinemia também é descrita com freqüências que variam de 7% a 42%(3). Por outro lado, pacientes com imunodeficiência comum variável (IDCV) ou Def IgA apresentam maior prevalência de AIJ, LESJ e síndrome de Sjögren(8).

A raridade de estudos de prevalência dessa associação, particularmente na população brasileira de AIJ e LESJ, e a expressiva casuística da Unidade de Reumatologia Pediá–trica do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (ICr- HC-FMUSP) estimularam a realização desta pesquisa.

Portanto, os objetivos do presente estudo foram descrever os pacientes que apresentaram artrite como manifestação inicial de imunodeficiências humorais primárias e avaliar a prevalência de Def IgA na população de pacientes com AIJ e LESJ, acompanhados nesse serviço terciário de reumatologia pediátrica.

PACIENTES E MÉTODOS

O estudo realizado foi transversal. Durante o período de 23 anos (janeiro de 1983 a dezembro de 2006), 4.876 pacientes foram acompanhados na Unidade de Reumatologia do ICr-HC-FMUSP e foram avaliados aqueles que apresentaram artrite como primeira manifestação de imunodeficiências humorais primárias. A avaliação retrospectiva dos prontuários médicos incluiu o registro de dados demográficos (sexo, idade de início da doença reumatológica e idade de diagnóstico da imunodeficiência primária), história de doença auto-imune ou imunodeficiências em parentes de primeiro e segundo graus, história de infecções de repetição, descrição detalhada da doença articular (padrão de início, duração dos sintomas, número de articulações comprometidas, distribuição do envolvimento articular, localização e seqüência de acometimento das articulações afetadas) e presença de manifestações extra-articulares.

As imunodeficiências humorais avaliadas no presente estudo foram: Def IgA (idade acima de 4 anos, níveis séricos de IgA <>(9).

A avaliação laboratorial de auto-imunidade incluiu dosagem de fator reumatóide e de auto-anticorpos: fator antinúcleo (FAN), anti-DNA nativo, anti-Sm, anti-Ro/SSA, anti-La/SSB, anticardiolipina (isotipos IgG e IgM) e anticoagulante lúpico. Outros auto-anticorpos, avaliados nos pacientes com LESJ para pesquisa de auto-imunidade órgão-específica, foram: tireóide (antiperoxidase, antitireoglobulina e anti-receptor de TSH – TRAB), fígado (antimitocondrial, antimicrossomal, antimúsculo liso e anticitosol hepático), trato gastrintestinal (anticélula parietal, antigliadina IgG e anti-endomísio) e diabetes melito (anti-insulina e antidescarboxilase do ácido glutâmico – anti-GAD). Radiografias das articulações acometidas foram também realizadas para pesquisa de osteopenia periarticular, erosões, cistos ósseos e anquilose.

O diagnóstico de LESJ foi estabelecido de acordo com os critérios de classificação do American College of Rheumatology (ACR), com início da doença antes dos 18 anos de idade(10). Os critérios do International League of Associations for Rheumatology (ILAR) foram utilizados para o diagnóstico de AIJ(11). O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Pesquisa e Ética do HC-FMUSP.

RESULTADOS

Ao longo de 23 anos, 4.876 pacientes foram acompanhados na Unidade de Reumatologia do ICr-HC-FMUSP. Destes, 620 pacientes tiveram diagnóstico de AIJ e 244, de LESJ.

Dos 620 pacientes que tiveram diagnóstico de AIJ, os prontuários de 253 foram avaliados e 70 (11%) tinham dosagens séricas de imunoglobulinas (IgG, IgA e IgM). A deficiência de IgA foi encontrada em 6/70 (8,5%) dos pacientes com AIJ (AIJ símile). Dos 244 pacientes com LESJ avaliados neste período, 45 (18%) realizaram dosagens séricas de imunoglobulinas, e deficiência de IgA foi encontrada em 3/45 (6,6%) dos pacientes com LESJ.

O diagnóstico de imunodeficiência humoral foi realizado retrospectivamente em 11 pacientes (0,2%), incluindo os seis pacientes com AIJ símile e os três com LESJ. A tabela 1 inclui características demográficas, tipo de imunodeficiência, presença de infecções de repetição e doença reumática. A tabela 2 compreende antecedentes familiares, manifestações extra-articulares e exames complementares desses 11 pacientes.

Dos 11 pacientes com diagnóstico de imunodeficiência humoral (0,2%), Def IgA foi encontrada em oito, imunodeficiência comum variável em dois e deficiência de subclasses de IgG em um. A proporção entre sexo feminino e masculino foi de 7:4. A média da idade de início dos sintomas articulares e a média do diagnóstico da imunodeficiência foi de 6,2 anos (variou de um a 15) e 8,2 anos (variou de três a 19), respectivamente.

Cinco dos 11 pacientes descritos apresentaram artrite aguda com envolvimento de grandes articulações do esqueleto apendicular. A presença de oligoartrite aguda ocorreu nos três pacientes com LESJ (casos 6, 8 e 9), poliartrite aguda recorrente em um (caso 10) e oligoartrite aguda recorrente em outro (caso 2).

Seis pacientes apresentaram artrite crônica não-erosiva (AIJ símile), e um deles apresentava limitações articulares em coluna cervical, punhos, metacarpofalangeanas, joelho direito e tornozelos. Comprometimento oligoarticular foi observado em um paciente, e poliartrite foi observada em cinco. Estudo radiológico foi realizado em todos os indivíduos e nenhum deles apresentou erosões, cistos ósseos ou anquilose.

Um aspecto relevante deste estudo foi evidenciado em duas pacientes com LESJ que apresentaram deficiência seletiva de IgA associada a diabetes melito tipo I de difícil controle e necessidade de bomba de infusão contínua de insulina. Uma delas apresentou pneumonias de repetição associadas com uma doença auto-imune sistêmica com tireoidite, diarréia crônica, doença pulmonar obstrutiva crônica, vasculite de sistema nervoso central, com presença de múltiplos auto-anticorpos, tais como: antiperoxidase, antiinsulina e antigliadina IgG. Outra teve glomerulonefrite membranoproliferativa, tireoidite, com presença de múltiplos auto-anticorpos: TRAB, anti-GAD e antiinsulina.

DISCUSSÃO

O presente estudo evidencia baixa prevalência de imunodeficiência humoral primária em associação com artrite na população de pacientes atendidos em um serviço terciário de reumatologia pediátrica (0,2%).

A Def IgA é a imunodeficiência primária de maior prevalência(6,12,13). Neste estudo, oito dos 11 pacientes descritos apresentaram essa imunodeficiência humoral. Apesar de a etiologia da Def IgA ainda ser desconhecida, auto-anticorpos anti-IgA podem exercer um papel em sua indução(12,14). Petty et al.(5) evidenciaram uma freqüência de anticorpos anti-IgA entre 19% e 100% dos pacientes com essa imunodeficiência. Além disso, esses autores mostraram maior prevalência desses auto-anticorpos em pacientes com associação de Def IgA com AIJ ou LES (77% e 100%, respectivamente). Dessa forma, a Def IgA com anticorpos anti-IgA presentes poderia ser considerada um distúrbio auto-imune(14). Outro aspecto relevante é que a Def IgA secundária a drogas como antiinflamatórios não-hormonais, ouro parenteral e D-penicilamina é freqüentemente descrita(15-21). Nove dos onze pacientes avaliados neste estudo desenvolveram imunodeficiências previamente ao uso de drogas anti-reumáticas. O paciente 2 fez uso apenas intermitente e esporádico de antiinflamatórios não-hormonais durante os episódios de artrite aguda. O paciente 9 fez uso de prednisona, ciclofosfamida e micofenolato mofetil dos 15 aos 19 anos, porém seus níveis séricos de IgA nunca haviam sido realizados antes, o que impossibilita relacionar a Def IgA à terapêutica da doença auto-imune.

As doenças reumatológicas mais freqüentemente associadas com Def IgA são artrite reumatóide, AIJ e LESJ. São descritas mais raramente associações dessa imunodeficiência com esclerodermia, dermatopolimiosite e doença mista do tecido conectivo(2). No presente estudo, dos oito pacientes com Def IgA avaliados, quatro apresentaram artrite crônica e três apresentaram diagnóstico de LESJ. Outra paciente apresentou oligoartrite aguda e úlceras orais recorrentes, mas não preencheu critérios diagnósticos para LESJ.

De acordo com a literatura, o quadro clínico, a proporção entre os sexos e a idade de início da artrite não diferem em pacientes com Def IgA isolada ou associada à AIJ. A distribuição dos tipos de início da AIJ associada à Def IgA é: oligoarticular em 64%, poliarticular em 32% e sistêmica em 4% dos casos(22-24). Neste estudo, três pacientes com artrite AIJ símile apresentaram início e evolução poliarticular e um paciente apresentou início e evolução sistêmicos. Na maioria dos pacientes, o curso da doença é leve com poucas limitações funcionais e sem lesões radiográficas, conforme evidenciado nos pacientes deste trabalho.

Um dos pacientes com Def IgA apresentou, além de artrite crônica, eritema nodoso recorrente como primeira manifestação da imunodeficiência primária. Essa associação tem sido raramente descrita na literatura. Tremeau-Martinage et al.(25) descreveram um caso de um paciente de sete anos de idade com Def IgA, paniculite auto-imune e presença de múltiplos auto-anticorpos.

Doença auto-imune ocorre em 20% a 30% de pacientes com IDCV e a prevalência de artrite associada a essa imunodeficiência varia de 20% a 30%(2,26,27). Em uma série de 103 pacientes com IDCV, três pacientes apresentaram artrite crônica semelhante à AIJ(26). Pipitone et al.(8) relataram maior prevalência de AIJ, LES, síndrome de Sjögren e cirrose biliar primária em pacientes com IDCV. No presente estudo, os dois pacientes com IDCV apresentaram artrite crônica.

Em relação à deficiência de subclasses de IgG, há poucos relatos de associação com doenças auto-imunes. Aucouturier et al.(28) descreveram uma associação de deficiên-cia de IgG2 com vasculite e citopenias em uma grande série de 450 pacientes portadores dessa imunodeficiência humoral. O único paciente desse estudo com deficiência de IgG2 apresentou poliartrite aguda intermitente de caráter inespecífico, associada com entesite e diarréia crônica. O diagnóstico de doença inflamatória intestinal foi descartado pela colonoscopia e pela biópsia dirigida.

Embora as infecções sejam as manifestações mais comuns e mais precoces das imunodeficiências primárias, doen-ças auto-imunes também são freqüentes nesses pacientes. A associação entre imunodeficiências humorais primárias e doenças reumatológicas pode ser explicada por algumas hipóteses. Defeitos do sistema imune podem resultar em dificuldade de depuração de agentes microbianos, resultando ativação imunológica crônica e sintomas auto-imunes. Alelos de HLA que predispõem tanto para a auto-imunidade quanto para a imunodeficiência, como o HLA-B8, DR3 e Cw6, comuns à doença celíaca e Def IgA, também podem estar relacionados com a ocorrência dessa associação (29,30). Além disso, as manifestações reumatológicas dos pacientes com imunodeficiências primárias, em sua maioria, são inespecíficas e não são preenchidos os critérios diagnósticos para AIJ ou LESJ. Essas manifestações poderiam ser consideradas, portanto, uma conseqüência da imunodeficiência primária. Por sua vez, nos pacientes com doença auto-imune que preencheram critérios de classificação para diagnósticos de AIJ ou LESJ, é muito difícil determinar se as manifestações articulares estão relacionadas à própria colagenose ou à imunodeficiência humoral. Nesses casos, existe uma tendência a se considerar essa imunodeficiência um evento paralelo ao quadro articular. Entretanto, em ambos os casos (de doença auto-imune específica ou AIJ/LESJ símile), a freqüência de imunodeficiência humoral é maior do que na população geral. Dessa forma, a associação entre imunodeficiência e auto-imunidade em um mesmo paciente poderia representar um espectro clínico causado por uma única anormalidade imunológica. A maior compreensão das bases moleculares das imunodeficiências e de suas conseqüências para o sistema imune poderá contribuir para um melhor entendimento da fisiopatologia das doenças auto-imunes.

A presença de infecções de repetição e história familiar de imunodeficiência e doença auto-imune reforça a necessidade de pesquisa rotineira das imunoglobulinas séricas nos pacientes com artrite. Além disto, esses exames devem ser preferencialmente solicitados nos pacientes com LESJ e AIJ, particularmente com infecções de repetição e história familiar de doença auto-imune.

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Revista Brasileira de Reumatologia

versão impressa ISSN 0482-5004

Rev. Bras. Reumatol. v.47 n.6 São Paulo nov./dez. 2007

doi: 10.1590/S0482-50042007000600006

ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE

Abordagem diagnóstica da tuberculose latente na artrite reumatóide

RESUMO

Apesar de terem revolucionado a prática reumatológica, o uso dos inibidores do fator de necrose tumoral (anti-TNFs) no tratamento da artrite reumatóide (AR) fez surgir um problema considerado solucionado em muitos países desenvolvidos: o risco elevado de reativação de infecção tuberculosa latente (ITBL). Desse modo, a identificação de casos de ITBL passou a ser obrigatória antes do início da terapêutica com anti-TNF. O teste cutâneo da tuberculina (PPD) não é um teste de screening ideal nesse grupo de pacientes em virtude de sua baixa especificidade, sua reação cruzada com antígenos vacinais e de outras micobactérias ambien-tais e, principalmente, por conta da incapacidade de o paciente com AR produzir uma resposta adequada ocasionada por uma anormalidade na responsividade das células T, característica da doença. Ensaios com base na detecção da produção de IFNg in vitro por células mononucleares periféricas estimuladas por antígenos específicos (ESAT-6 e CFP-10), que não são encontrados na vacina BCG nem em outras micobactérias ambientais, parecem ser mais acurados que o PPD na detecção de ITBL em virtude de maior especificidade, melhor correlação com medidas indiretas de exposição ao Mycobacterium tuberculosis e menor reação cruzada com a vacinação por BCG e infecções por outras micobactérias.

Palavras-chave: artrite reumatóide, tuberculose, anti-TNF.

INTRODUÇÃO

O surgimento, na década de 1990, dos inibidores do fator de necrose tumoral (anti-TNFs) para tratamento da artrite reumatóide (AR) revolucionou a prática reumatológica por permitir um controle da doença mais adequado nos casos refratários ao tratamento com os DMARDs (disease-modifying antirheumatic drugs) convencionais, e conseqüentemente, pela grande melhora da qualidade de vida desses pacientes. No entanto, o uso dos anti-TNFs fez surgir um problema, considerado resolvido em muitos países desenvolvidos: o risco elevado de reativação de infecção tuberculosa latente (ITBL)(1). A presença do TNF é crítica na prevenção do estabelecimento doMycobacterium tuberculosis e na preservação da tuberculose em sua forma latente, mantendo a integridade do granuloma(2). Desse modo, o bloqueio dessa citocina com a terapêutica anti-TNF favorece o aparecimento de infecção ativa nos casos em que ela permanecia latente(3).

Uma revisão recente sobre a incidência de infecções granulomatosas após tratamento com as drogas biológicas, relatadas à U.S. Food and Drug Administration (FDA), de setembro de 1998 a setembro de 2002, evidenciou uma taxa que variou de 74 a 197 por 100.000 pacientes tratados, dependendo da droga utilizada(4). Existem evidências substanciais que o risco de reativação de tuberculose (TB) aumenta de cinco a dez vezes após o uso dos anti-TNFs quando comparados com outros tratamentos na mesma população(4,5,6).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que mais de um terço da população do planeta está infectada com o M. tuberculosis. Esse enorme reservatório de indivíduos infectados tem sido a maior barreira na tentativa de um controle global da TB, além do fato de que, essas formas latentes de infecção podem, durante o tratamento com anti-TNF, transformar-se em infecção ativa(7,8).

Em 2000, ocorreram 8,3 milhões de novos casos e 1,8 milhão de óbitos em virtude de TB, tornando-a a segunda maior causa de morte em decorrência de um agente infeccioso identificado, só perdendo para a infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV)(9,10).

Um diagnóstico rápido e acurado para TB ativa é o elemento mais importante para o controle da doença. O padrão-ouro no diagnóstico ainda é o exame clínico, combinado com o exame microscópico direto do escarro e a cultura da bactéria. A cultura do M. tuberculosis pode demorar cerca de oito semanas para demonstrar crescimento, e em 10% a 20% dos casos, o bacilo não cresce adequadamente. Assim, o diagnóstico deve ser feito com base em achados clínicos e alterações radiológicas, o que leva a um atraso na confirmação de casos de suspeita de TB. Além disso, não é possível a detecção precoce de uma infecção subclínica utilizando essa forma de abordagem, uma vez que para o diagnóstico é necessário o aparecimento de sintomas clínicos(11).

Quanto à TB latente, é possível a realização de testes para seu diagnóstico precoce antes do aparecimento de sintomas. O tratamento de formas latentes de infecção tuberculosa (quimioprofilaxia) é, portanto, parte fundamental da estratégia de controle da doença. Esse deve ser realizado especialmente quando diante de dois grupos de pacientes: recentemente infectados (contato com pessoas que apresentam infecção tuberculosa) e pessoas que apresentem risco de desenvolver a doença após contato com o M. tuberculosis em virtude de determinadas condições clínicas, incluindo doenças auto-imunes e infecção pelo vírus HIV(12). No Brasil, de acordo com o II Consenso Brasileiro de Tuberculose, publicado em 2004(13), a quimioprofilaxia com isoniazida deve ser realizada nos seguintes grupos de pacientes durante seis meses:

a. Recém-nascidos co-habitantes de um foco de TB ativa;
b. Crianças menores de 15 anos, contactante de TB ativa, com PPD
> 10 mm nos não-vacinados com bacilo de Calmette-Guérin (BCG) ou com PPD > 15 mm nos vacinados;
c. Indivíduos com viragem tuberculínica recente (acima de 10 mm, nos últimos 12 meses);
d. População indígena, contactante de TB ativa, com PPD reator forte, independentemente da idade e do estado vacinal, sem sinais de doença ativa;
e. Imunodeprimidos por uso de drogas ou por doença imunossupressora;
f. Contactantes intradomiciliares de caso de TB ativa, sob criteriosa avaliação médica;
g. Reatores fortes à tuberculina, sem sinais de doença ativa, mas portadores de condições clínicas que favoreçam a infecção: alcoolismo, diabetes melito insulino-dependente, nefropatia crônica, silicose, sarcoidose, linfoma, uso prolongado de corticosteróide em dose de imunossupressão, quimioterapia antineoplásica, radiografia de tórax compatível à TB inativa, sem história de quimioprofilaxia;
h. Indivíduos infectados pelo vírus HIV, com PPD
> 5 mm.

O tratamento das formas latentes reduz a incidência da doença ativa em 75%, diminuindo assim sua morbimortalidade(8).

O teste cutâneo da tuberculina com preparação padrão de proteína derivada purificada (PPD) utilizado desde 1930 para determinar o risco de infecção pelo M. tuberculosis contém uma mistura de antígenos que induz a uma reação de hipersensibilidade tardia. Apesar de suas conhecidas limitações na sensibilidade e na especificidade, continua sendo utilizado como critério standard para o diagnóstico de ITBL(14). Na prática, a realização deste como screening para TB é um tanto desanimadora em virtude de sua baixa especificidade, uma vez que a vacinação recente com BCG e a exposição a outras micobactérias produzem uma resposta imunológica celular similar àquela induzida pela infecção pelo M. tuberculosis(13).

O tamanho da reação ao PPD é usado para classificar os indivíduos de acordo com a probabilidade de ter ou não a infecção. Dentre suas limitações, podemos citar o fato de que, por ser mensurado em uma escala contínua, não tem o valor inerente de indicar a presença ou a ausência de infecção. Deste modo, foram estabelecidos critérios usando um ponto de corte, acima do qual o PPD é considerado positivo (ou seja, indica a presença de ITBL)(13,15).

O resultado, registrado em milímetros, classifica-se como:

  • 0 mm a 4 mm – não reator: indivíduo não infectado pelo M. tuberculosis ou com hipersensibilidade reduzida;
  • 5 mm a 9 mm – reator fraco: indivíduo vacinado com BCG ou infectado pelo M. tuberculosis ou por outras micobactérias;
  • l0 mm ou mais – reator forte: indivíduo infectado pelo M. tuberculosis, que pode estar doente ou não, e indivíduos vacinados com BCG nos últimos dois anos.

Algumas circunstâncias podem interferir no resultado da prova tuberculínica, por exemplo: doenças imunossupressoras como sarcoidose, síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA), neoplasias e doenças linfoproliferativas; tratamentos com corticosteróides e drogas imunodepressoras; gravidez; crianças abaixo de dois anos e idosos acima de 65 anos. Nos indivíduos infectados pelo vírus HIV, considera-se reator aquele que apresenta endurecimento de 5 mm ou mais e não reator aquele com endurecimento entre 0 e 4 mm. Nos indivíduos vacinados com BCG, sobretudo entre aqueles imunizados há até dois anos, a prova tuberculínica deve ser interpretada com cautela porque, em geral, apresenta reações de tamanho médio podendo alcançar 10 mm ou mais(13). Além disso, a variabilidade de leitura inter e intra-observador, a necessidade de pessoal treinado para a leitura e do retorno do paciente para a leitura da enduração torna ainda mais complicada sua utilização como teste de triagem(16).

DIAGNÓSTICO DA ITBL ANTES DO INÍCIO DA TERAPIA COM INIBIDORES DE TNF

Decorrente do aumento da incidência e da severidade de infecções tuberculosas após o início do uso dos anti-TNFs no tratamento da AR, a identificação de casos de ITBL passou a ser obrigatória antes do início da terapêutica(6,17,18). As orientações brasileiras para diagnóstico da ITBL ou doença ativa orientam que na avaliação antes do início do tratamento com anti-TNF deve ser incluída história clínica completa, com tratamento ou quimioprofilaxia anteriores ou contato intradomiciliar ou institucional com TB, radiografia de tórax e realização do PPD. A radiografia de tórax é considerada suspeita quando apresenta imagem sugestiva de tuberculose ativa ou de complexo primário. O PPD é considerado positivo quando apresenta valor acima de 5 mm. A utilização desse ponto de corte em vez de 10 mm para exames positivos minimiza a interferência da AR e do tratamento imunossupressor sobre a hipersensibilidade(18).

Após a adoção de medidas para identificação dos casos de ITBL e a realização da quimioprofilaxia com isoniazida nos casos identificados – PPD reator (> 5mm), independentemente do raio X de tórax ou PPD não-reator (<>(6,16,18,19,20).

Um grande complicador para o diagnóstico prévio de ITBL nos portadores de AR é a anormalidade da função celular imune(21) observada nesses doentes. Existe uma diminuição da responsividade de células mononucleares periféricas, o que acarreta prejuízo para hipersensibilidade cutânea tardia e para o reconhecimento de antígenos, como é o caso do PPD(21,22,23). Não se sabe exatamente o mecanismo para essa alteração, mas já foi demonstrado que esta pode ser ocasionada pela deficiência da produção de IL-2(24) ou exposição crônica ao TNF(22). Um trabalho recente demonstrou que o número de células T CD4+ está diretamente relacionado com a magnitude da resposta ao PPD(25). As células T regulatórias (TReg) (CD4+CD25+), que tem papel fundamental na prevenção da auto-imunidade, apresentam diminuição em número e função na AR(26).

O teste de Mantoux avalia in vivo a resposta celular imune contra a proteína purificada derivada do M. tuberculosis, resultando uma reação clássica de hipersensibilidade cutânea tardia, dependente da migração de células T CD4+ produtoras de INFg para o local da injeção do antígeno. Pacientes com AR apresentariam uma incapacidade de produção de resposta adequada ao PPD, mesmo em indivíduos infectados pelo M. tuberculosis,tornando o teste inapropriado para o reconhecimento das formas latentes nesses pacientes(24). Algumas autoridades recomendam inclusive que pacientes com AR e PPD negativo, mas que tenham grande risco clínico ou epidemiológico para infecção tuberculosa, sejam empiricamente tratados para ITBL antes do início da terapia com uma droga biológica(14).

Em um estudo desenvolvido no Peru(27), onde a TB é endêmica, o PPD foi realizado em um grupo de pacientes com AR e num outro, de voluntários imunocompetentes, pareados por sexo e idade. Foi considerado positivo um resultado maior ou igual a 5 mm no grupo AR e maior ou igual a 10 mm no grupo imunocompetente. Um resultado menor do que 5 mm após 72 horas foi considerado negativo, nos dois grupos. Foi identificada uma positividade de 71% do PPD no grupo imunocompetente contra 29% no grupo com AR. Todos os pacientes do grupo AR utilizavam doses menores que 7,5 mg/dia de corticosteróide, o que reconhecidamente não suprime a hipersensibilidade cutânea tardia. Essa discrepância de resultados foi associada à anormalidade da imunidade celular da AR.

Em outro estudo realizado na Turquia, área onde a prevalência de TB é relativamente elevada, foi observada uma baixa positividade do PPD (29,8%) quando comparada com pacientes portadores de espondilite anquilosante (65,9%), artrite gotosa (68,8%) e osteoartrite (63%)(28).

Provenzano et al.(17) avaliaram 69 pacientes italianos portadores de doença inflamatória articular crônica, que se submeteriam ao tratamento com anti-TNF. Durante o screening para ITBL foram encontrados 2,9% de pacientes com história prévia de TB tratada, 8,7% de PPD positivo e alterações radiográficas compatíveis com seqüela de TB em 20,3%, demonstrando falha do PPD em identificar todos os pacientes portadores de ITBL, tornando a prática da realização da radiografia de tórax obrigatória.

NOVOS TESTES PARA IDENTIFICAÇÃO DE ITBL

O desenvolvimento de testes alternativos para identificação de ITBL tem sido alvo de inúmeras pesquisas. Um teste para ITBL ideal deveria ter alta sensibilidade em todas as populações de risco, bem como alta especificidade, independentemente da vacinação anterior com BCG ou infecção por outras micobactérias, deveria ser seguro, estável ao longo do tempo, ter critérios objetivos para a positividade, ser barato e de fácil realização(8).

Uma nova geração de testes está sendo desenvolvida objetivando atingir essas características ideais. A identificação de regiões do genoma do M. tuberculosis que estão ausentes no BCG e em outras micobactérias ambientais permitiu a oportunidade do desenvolvimento dessas novas ferramentas diagnósticas. A região de diferença 1 (RD1), presente em várias espécies de micobactérias, é deletada primariamente durante a transformação do Mycobacterium bovis para BCG, e conseqüentemente os genes decodificados por ela. A RD1 compreende os genes Rv3871 a Rv3879c, o que inclui os genes para o 6 kDa alvo antigênico precocemente-secretado (early-secreted antigenic target – ESAT-6) e a proteína homóloga L45 – cultura filtrada de proteína 10 (CFP-10). As duas proteínas codificadas por essas regiões, ESAT-6 e CFP-10, são utilizadas como antígenos específicos em virtude de sua ausência na vacina BCG e em outras micobactérias. Estes induzem uma forte resposta imune das células T em modelos experimentais, levando à produção de interferon-g (IFN-g), o qual é quantificado pelo teste(8,11,16,29,30).

Evidências sugerem que os ensaios com base na detecção de IFN-g têm um melhor desempenho que o PPD pelos seguintes motivos: alta especificidade, melhor correlação com medidas indiretas de exposição ao M. tuberculosise menor reação cruzada com a vacinação por BCG e infecções por outras micobactérias(11,31,32).

As primeiras versões destes testes (QuantiFeron-TB® – Cellestis Limited, Carnegie, Austrália), aprovadas pela FDA em 2001, utilizavam o PPD como um antígeno estimulador, o que levava aos mesmos problemas de especificidade vistos nos testes cutâneos. Por isso, este ensaio foi substituído por outro, o Quantiferon-TB-Gold®, que usa ESAT-6 e CFP-10 no lugar do PPD. O Quantiferon-TB-Gold® utiliza sangue total e quantifica a presença do IFN-g por meio da técnica de ELISA (Enzyme-Linked-Immunosorbent-Assay). Após 16 horas a 24 horas de incubação, a quantidade de IFN-g secretada pelos monócitos em resposta à estimulação com esses antígenos é mensurada(16). O teste apresenta elevada especificidade (acima de 98%, contra 35,4% do PPD, usando um ponto de corte de 10 mm) em indivíduos saudáveis vacinados com BCG(33).

Estudo realizado na Coréia em voluntários sadios demonstrou uma baixa correlação entre o Quantiferon-TB-Gold®(15% de positividade) e o PPD (58% de positividade, para um ponto de corte de 10 mm), o que não acontece em países onde a TB não é endêmica(34). A concordância em países industrializados pode variar de 89% a 94%(35,36).

Existem duas explicações para essa discordância. Uma seria com base no número de resultados falso-positivos do PPD, ocasionado principalmente pela vacinação com BCG e pela infecção por micobactérias ambientais. Outra, com base no número de resultados falso-negativos com o Quantiferon®, que pode subestimar a presença de ITBL, uma vez que os antígenos utilizados na técnica não são responsáveis pela antigenicidade completa do M. tuberculosis(34), constituindo um possível problema em áreas endêmicas.

O T SPOT-TB (Oxford Immunotec, Oxford, Inglaterra) usa um ensaio de ELISPOT (Enzyme-Linked-Immunospot Assay) utilizando células mononucleares periféricas produtoras de IFN-g em resposta à estimulação com ESAT-6 e CFP-10(8).

Numerosos estudos têm sido realizados para determinar as características operacionais do T SPOT-TB no diagnóstico de ITBL, porém a ausência de um padrão-ouro nesses casos limita a qualidade dos estudos(8). Para contornar esse problema, podem ser utilizadas duas formas diferentes de abordagens. Em uma, os resultados do novo teste são comparados diretamente com os do PPD, sendo em seguida calculado o nível de concordância. Essa forma de avaliação é útil, pois se pode comparar o desempenho do novo teste, com um já bastante conhecido, como o PPD(16). Outra forma de abordagem é aquela em que é construído um instrumento de validade com base em critérios, por exemplo, características clínicas ou epidemiológicas, nas quais é possível correlacioná-las com o risco de se desenvolver a ITBL e a resultado do novo teste(37).

O T SPOT-TB foi inicialmente validado e comparado com o PPD em pacientes com cultura positiva para infecção tuberculosa e em controles sem doença. A sensibilidade alcançada foi de 96%, significantemente mais elevada do que a do PPD, que foi de 69%(32). Diferentemente do que ocorre com o PPD, o ELISPOT não é susceptível a falsos-negativos em casos de infecção ativa, bem como mantém alta sensibilidade em pacientes HIV-positivos infectados pelo M. tuberculosis(38).

Meier et al.(29) estudaram 92 pacientes alemães, com TB suspeita ou confirmada, comparando o T SPOT-TB com métodos diagnósticos convencionais. A sensibilidade do teste foi de 97,2% (positivo em 70 de 72 pacientes com TB ativa, pulmonar ou extrapulmonar). O PPD foi realizado em 45 destes pacientes, e somente 89% deles tiveram resultados positivos versus 100% do T SPOT-TB (p = 0,056). Dentre os 12 pacientes onde a infecção tuberculosa foi descartada, o T SPOT-TB foi negativo em 11 (92%), permitindo a rápida exclusão da infecção.

Tanto o Quantiferon-TB-Gold® quanto o ELISPOT-TB já estão aprovados na Europa, e de acordo com o National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE), podem ser utilizados da seguinte forma(39):

  • realizar o teste de Mantoux;
  • nos casos em que o resultado for positivo, realizar o teste imunológico com base na detecção do IFN-g;
  • se o teste for inconclusivo, encaminhar a um especialista em TB, para avaliação de ITBL.

O Quantiferon-TB-Gold® está aprovado também nos Estados Unidos, e o Center for Disease Control (CDC) recomenda que ele pode ser usado em todas as circunstâncias em que o PPD é atualmente utilizado, incluindo a investigação de contactantes de TB ativa, devendo ser utilizado em substituição e não em adição ao teste de Mantoux(40).

Apesar da aparente maior sensibilidade do ELISPOT e maior especificidade do Quantiferon, mais estudos são necessários antes que possam ser considerados superiores ao PPD no diagnóstico da ITBL em todas as situações clínicas. A escolha da melhor técnica dependerá do contexto clínico. Assim como o PPD, o resultado desses novos testes devem ser interpretados com cautela, levando-se sempre em consideração o estado epidemiológico da tuberculose na região estudada e as condições imunológicas individuais, que podem diminuir a resposta de ambos os testes(41).

Até o presente momento só existe um trabalho publicado avaliando o desempenho do teste para detecção de IFN-g em pacientes com AR. Takahashi et al.(42) utilizaram o Quantiferon-TB Gold® para o diagnóstico de ITBL, comparando com PPD, radiografia de tórax e história clínica, previamente e durante o uso de infliximabe. A taxa de concordância entre o Quantiferon® e os métodos tradicionais foi de 64,3%, sugerindo que o método é capaz de detectar ITBL em pacientes com AR não identificados por outros métodos, aumentando a segurança quando da utilização de um inibidor de TNF(42). Somente o teste do Quantiferon® foi capaz de identificar ITBL em dois pacientes. Por outro lado, esse teste foi negativo em três de cinco pacientes diagnosticados como ITBL pelos métodos convencionais(42).

A infecção tuberculosa ativa é uma séria possibilidade durante o tratamento com todos os anti-TNFs, principalmente em nosso país, área considerada endêmica para a doença. Importante lembrar que a forma de aparecimento da tuberculose nesses casos tende a ser extrapulmonar, grave e disseminada, o que confere maior morbidade e maior dificuldade diagnóstica. A implementação de estratégias para identificação de TB latente, principalmente na população de risco, pode diminuir o impacto da infecção tuberculosa nesses pacientes e a utilização de testes com base na produção de IFN-g estimulada pelos antígenos específicos do M. tuberculosisESAT-6 e CFP-10 pode ser de grande utilidade para detecção de ITBL em nossa população.

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